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Carona de Palavras

A tinta ainda estava molhada quando Elena caiu

Não houve grito, nem respingo. Apenas o silêncio de quem sabe que algumas mortes começam muito antes do corpo afundar. 

Carona de Palavras

A verdade boia, mas o medo afunda
Elena boiava na piscina rasa, mas algo mais pesado que a água puxava Geovana e Mariana para o fundo: o medo. A história ainda não estava pronta, mas já era tarde demais para voltar atrás. A verdade, essa, insistia em vir à tona. Só que onde há amor mal resolvido, até a ficção pode virar arma.

A Desembréia de Deus seguia sua jornada como quem atravessa os mares vermelhos do trânsito paulistano. Jogo grande [ Cruzeiro 2 x 1 Palmeiras ] não era no Allianz ~ era no Mineirão ~, mas, a torcida espalhada por tudo quanto é calçada, bandeira em punho, buzina por dentro e por fora. Pompéia estava mais agitada que confessionário em véspera de romaria.

Foi ali, nas imediações do Shopping Bourbon, que Geovana e Mariana entraram no meu carro ~ duas mulheres com pressa de ir embora, mas não sabiam se era do bairro, da cidade ou de si mesmas. Pediu-se o Metrô Higienópolis-Mackenzie como destino, mas pelo GPS, Marechal Deodoro ou até a velha Barra Funda estariam mais próximas. Ainda assim, segui a rota solicitada. Não sou de definir destinos, apenas conduzo.

Mas algo nelas não batia com o cenário. Nervosas demais para torcedoras. Olhares que se cruzavam como quem confirma a mesma história ensaiada. Aquele nervosismo não era sobre o trânsito, nem sobre a camisa errada no lugar errado ~ era sobre algo maior. E foi ali que Geovana, num tom entre confissão e roteiro de streaming, começou a narrar.

— Acordamos tarde ~ ela disse, olhando pela janela como quem evita se ver no retrovisor. ~ A noite tinha sido longa, intensa, daquelas que a gente não programa, só vive. Lençóis macios, muito champagne, beijos, morango do amor e blackout total. O tipo de sono que só vem depois do amor cansado e bom, sabe como é?

E, mesmo que soubesse, ainda em pensamento, minha resposta era não!

— Tudo o que queríamos ~ completou Mariana, no banco ao lado ~ era tomar um café reforçado e voltar pra cama. Amor de hoje, sabe como é, Frei… a gente não programa pra amanhã.

Assenti com um sorriso que não julga nem concorda. Sou só o condutor. Mas a história se amargou de repente.

— Só que tinha um corpo na piscina. E não era qualquer corpo. Era Elena.

Foi aí que me vi obrigado a interromper. Reduzi a marcha e perguntei, quase estacionando:

— Quem é Elena? 

Geovana hesitou, mas Mariana respondeu rápido, como quem segura a narrativa pelas rédeas:

— Nadadora profissional. Mulher cheia de energia, cheia de vida. Nunca se afogaria numa piscina rasa como aquela. Era um metro e meio, Frei. Nem criança se afoga ali.

— A não ser que… ~ murmurei, mais pra mim mesmo do que pra elas.

Geovana então completou, com um tom que já não era mais de culpa, mas de construção:

— Elena… é a personagem do meu livro.

Por um segundo, fiquei no limbo entre ficção e boletim de ocorrência. Um corpo real ou uma metáfora literária? Havia sangue na cena ou apenas tinta no papel? A dúvida me atravessou mais que o congestionamento.

— E eu? ~ pensei. ~ Levo pra delegacia ou pro metrô?

Enquanto o Waze indicava uma conversão à direita, meu coração apontava pra esquerda. Mas fiz o que sempre faço: segui o destino solicitado. Nem sempre é minha função entender o enredo. Sou só o capítulo em que elas entram no carro, contam parte da história e depois descem, levando seus mistérios com elas.

A última frase antes do silêncio veio de Mariana, já perto da estação:

— Frei, a gente escreve pra não enlouquecer. Às vezes, até mata uma personagem pra sobreviver à própria história.

Ela riu, mas o olhar dela… ah, o olhar dizia outra coisa.

Geovana apenas disse “obrigada” e fechou a porta. E a Desembréia de Deus partiu, com um novo enigma no banco de trás.

Frei e-uBer, motorista de histórias e espectador de vidas, assina esta crônica entre um congestionamento e uma esperança.
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Em cada corrida uma Estória. Em cada Estória: Fé que transforma!
Frei e-Uber | Desembréia de Deus

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Frei e-Uber

A cidade grande não recebeu o jovem sonhador com braços abertos. Sem dinheiro e sem conhecer ninguém, dormiu em rodoviárias e passou fome antes de encontrar um emprego lavando pratos em uma lanchonete. Subiu para chapeiro e depois subchefe, trabalhando exaustivamente, agarrando cada oportunidade, cada centavo. Mas a promessa de voltar para buscar sua família parecia sempre mais distante.

Foto de Matheus Natan: https://www.pexels.com/pt-br/foto/pessoas-cruzando-a-rua-1813406/